"A ÓPERA DO ENGANO: Bastidores de Cinismo e o Declínio Cultural nos Teatros Municipais"

PALAVRAS estas de um leitor consciente e realista, transcrito aqui para uma reflexão do crítico Marco Antônio Seta


  " A maquiagem institucional, aplicada com pincéis de cinismo e retórica vazia, mal disfarça a podridão que se alastra nos bastidores. Os maquiavélicos por detrás das coxias — articuladores de conveniências e favorecimentos — operam com maestria nas sombras, manipulando narrativas e silenciando vozes autênticas. Na classe musical, os “guetos” protecionistas formam redutos de privilégio disfarçados de resistência. Neles, impera a lógica da exclusão disfarçada de inclusão, onde a curadoria serve mais aos interesses de seus pares do que à arte em si. A vergonha é pública, mas a manutenção do sistema se dá nos bastidores, onde os pactos são selados longe dos olhos e ouvidos do povo. Enquanto isso, o Brasil sangra em silêncio, padecendo dia após dia sob o peso de uma cultura instrumentalizada e de instituições que fingem servir ao bem comum, mas estão a serviço de suas próprias máscaras"

            O parágrafo acima relata amplamente a situação dos teatros municipais tanto de São Paulo como o do Rio de Janeiro, que divulgam as suas temporadas anuais no atual decânio exatamente com esse teor de cinismo e retórica vazia, envolta nos guetos protecionistas formando alí os redutos de privilégio disfarçados de resistência. Ao analisarmos os anos já passados tanto no Rio de Janeiro como em São Paulo (em seus Theatros Municipais)  nos deparamos com um tempo que se esvai a cada ano que se passa. 

        Em diferentes épocas — incluindo o período de intensa aceleração do "boom imobiliário", o expressivo adensamento urbano da cidade de São Paulo e a influência de diversas etnias que aqui se estabeleceram —, destacam-se mudanças políticas e culturais profundas, especialmente a partir de 1949, com a chegada da revolução industrial à nossa cidade. Desde então, o Theatro Municipal passou a receber grandes nomes da cena artística internacional, embora já contasse, anteriormente, com apresentações históricas de astros como Enrico Caruso, Toti Dal Monte, Rosina Storchio, Amelita Galli-Curci, Titta Ruffo, Bernardo De Muro, Rosa Raisa, Geneviève Vix, Gilda Dalla Rizza, Tito Schipa, Giulio Crimi, Aureliano Pertile, Gabriella Besanzoni, Lucia Torelli, Gaetano Azzolini, Maria Barrientos, Zola Amaro, Tamaki Miura, Beniamino Gigli, Claudia Muzio, Carlos Galeffi, Lily Pons,  Giacomo Lauri-Volpi, Ninon Vallin, Carlo Tagliabue, Gino Varelli, Italo Tajo, Nicola Rossi-Lemeni, Isadora Duncan, Maria Olenewa e Vaslav Weltcheck entre muitos outros astros e estrelas da ópera e do ballet de grande envergadura da época.

            Após sobreveio a temporada lírica de 1951, um marco na história do Theatro Municipal, onde vieram de passagem pelo Brasil, na sequência de suas atuações no célebre Teatro Colón de Buenos Aires, e diga-se de passagem,  empresariados pelo saudoso Sr. Alfredo Gagliotti, cantores de diversas origens, os maiores cantores de projeção internacional; entre os mais célebres: Helena Arizmede, Agnes Ayres, Elisabetta Barbato, Maria Callas, Anna Faraone, Norina Grecco, Eliana Leozzi, Ingard Muller, Renata Tebaldi e Angélica Tuccari;  Beniamino Gigli, Giuseppe Di Stefano,  Mario Fillipeschi, Mirto Pircchi, Cesare Vallletti, Mariano Caruso,  Nino Crimi, Arnaldo Pescuma e Rodolfo Neri;  Gino Bech, Tito Gobbi, Enrico Campi, Guilherme Damiano, Paulo Fortes, .Giuseppe Gaudiose, Raul Gonçalves, Mario Girotti, Ettore Sbrana, Marino Terranova, Giuseppe Modesti,. Giulio Neri, José Perrotta e Nicola Rossi-Lemeni; Fedora Barbieri, Kleusa De Pennafort e Gilda Rosa.  Maestros Concertatores: Tullio Serafim, Umberto Berretone,  e o ítalo-brasileiro Edoardo De Guarnieri. A direção artística dessa grande temporada paulistana se deu sob o comando do saudoso maestro Armando Belardi ( a Nacional de Outono) e do maestro Tullio Serafim. (elencos da temporada Internacional de Inverno). Apresentaram-se nesta narrativa (vinte e três operas!!!).

       

 Na sequência o Theatro Municipal permaneeu fechado durante quatro anos (1951-1955) reabrindo-se após grande reforma, a 25 de outubro de 1955 agora sob a direção artística de Eleazar  de  Carvalho com a ópera "Lo Schiavo", de Carlos Gomes, com Giuseppe Taddei, Antonietta Stella, Agnes Ayres, Antonio Salvarezza, Italo Tajo, José Perrotta, Aquilino Godinho e Marino Terranova. E daí por diante sobrevieram grandes temporadas líricas no decorrer das décadas de 1960/70; sucedidas pelo Projeto´Pró-Ópera em 1981 a 1983; voltando a estaca zero;   daí por diante....várias fases negativas e positivas sobrevieram na história do Theatro Municipal de São Paulo (1911< 2025.....).

            Hoje o que vemos aí, é o parágrafo inicial deste artigo, mais verdadeiro do que qualquer texto que se possa escrever: a encenação de sete (7) títulos mal escolhidos, sem a menor criatividade,  e que servem para satisfazer os egos daqueles que as programaram, formando redutos de privilégio disfarçados de resistência. Neles, impera a lógica da exclusão disfarçada de inclusão, onde a curadoria serve mais aos interesses de seus pares de que à arte em si. ou seja: as óperas decididas a serem produzidas pelos burocratas da municipalidade. A cultura instrumentalizada  e de instituições que fingem servir ao bem comum,  subtráem e desconstróem o conhecimento, a beleza e a realidade do mundo da Ópera com encenações enganosas, deturpadas, lacradas e estereotipadas, numa enganação infinita aos espectadores que lá comparecem. 


Nada mais é que o oco descompensado revestido de uma armadura para segurar a onda. 


Escrito por Marco Antônio Seta, em 27 de Abril de 2025.

Jornalista inscrito sob o nº 61.909 MTB / SP


Comentários

Anônimo disse…
Li o texto "A Ópera do Engano" e concordo com a crítica feita. Hoje, a cultura pública parece ter sido sequestrada por interesses de grupos que se protegem atrás de discursos vazios. O texto acerta ao mostrar que o que era para ser espaço de arte virou palco de acordos políticos e cinismo.
A comparação com o passado não é saudosismo — é um alerta de que já fizemos melhor e que aceitar o que temos hoje como "evolução" é uma grande mentira. Apoio a crítica do autor e acho que precisamos, sim, cobrar mais responsabilidade e autenticidade de quem administra nossos espaços culturais.
Anônimo disse…
As palavras desse crítico revelam um conhecimento enorme sobre a história do Teatro Municipal de São Paulo, e mostra o senso crítico equilibrado desse senhor jornalista que não engole as mentiras e trapaças que assolam a atual administração que rege o Teatro de ópera de São Paulo.
Realmente é.mujto triste a redução do número de óperas comparado com outras décadas., e a qualidade de seus intérpretes.