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A dramaturgia da guerra e a balbúrdia administrativa no Theatro Municipal
Por Marco Antonio Seta
A programação recente do Theatro Municipal de São Paulo revela um eixo temático que se repete com insistência: a guerra. Não se trata de negar a relevância das obras escolhidas, mas de problematizar a curadoria que insiste em enquadrar a experiência musical sob uma única chave dramática.
O War Requiem, de Benjamin Britten, trouxe à sala lírica ecos da Segunda Guerra Mundial, evocando Coventry e sua reconstrução. Logo em seguida, a ópera Friedenstag, de Richard Strauss, expôs com brutalidade a atmosfera bélica às vésperas de 1939. Parte do público sequer resistiu ao peso da encenação sonora e deixou o teatro antes do fim.
E não parou por aí. O Municipal voltou-se então para a Rússia medieval, com o Alexander Nevsky, de Prokofiev. Mais uma vez, o fio condutor não foi o herói cultural ou espiritual, mas o líder militar. Entre 1240 e 1242, Nevsky conduziu batalhas emblemáticas contra os suecos no rio Neva e contra os Cavaleiros Teutônicos no lago Peipus que se tornaram símbolos da resistência russa. Transformado em música e em mito, o personagem foi apresentado em São Paulo como mais um episódio da dramaturgia bélica.
A execução coube à Orquestra Sinfônica Municipal, regida por Roberto Minczuk. Mais uma vez, os metais deslizaram trompas e trombones, especialmente somados a alguns desencontros rítmicos e breves passagens de exageros no colorido orquestral. O Coro Lírico Municipal, por sua vez, foi o ponto alto do concerto: venceu as complexas modulações que Prokofiev impõe à massa coral e apresentou vozes robustas, de sonoridade realmente lírica, resultado da excelente preparação do maestro argentino Hernán Sánchez Arteaga.
Do ponto de vista estético, cada obra possui méritos inegáveis. Mas a sequência programada pela administração atual revela um reducionismo curatorial: reiterar a guerra como se fosse a única narrativa capaz de sustentar a vida musical do Municipal. Uma casa centenária que deveria ser plural em repertórios e olhares, reduzida a um imaginário repetitivo e opressivo.
Se na esfera artística a escolha soa monotemática, na esfera administrativa a situação é ainda mais grave. A Sustenidos Organização Social de Cultura, responsável pela gestão do teatro, instaurou a prática de vender ingressos de última hora por preços simbólicos. À primeira vista, a medida poderia parecer um gesto de democratização. Na prática, converte-se em um escárnio contra o público fiel.
Espectadores que adquiriram ingressos meses antes, pagando valores elevados, veem-se preteridos por uma massa de ingressantes tardios que, sem qualquer controle efetivo, invadem poltronas vagas. A cena é de balbúrdia: confusão nos corredores, discussões acaloradas, até barracos entre quem respeitou as regras de compra e os “intrusos” favorecidos pela política improvisada.
Um teatro de ópera não é apenas um espaço de música; é também um lugar de ritualidade, de etiqueta e de respeito ao público. Transformar a plateia em praça de desordem é atentar contra a dignidade do Theatro Municipal. Não se trata apenas de gestão falha, mas de desrespeito institucionalizado.
Ao insistir em uma dramaturgia bélica no palco e permitir uma guerra de cadeiras na plateia, a atual administração da Sustenidos transforma o Municipal em arena de conflito estético e social. O público que sustenta, prestigia e paga o teatro merece mais do que trincheiras: merece respeito, diversidade e ordem.
Socorro deve ser dito, e alto.
O Municipal não pode virar trincheira
A atual programação do Theatro Municipal de São Paulo revela uma obsessão temática: guerra, guerra e mais guerra. De Britten a Strauss, de Prokofiev a "Alexander Nevsky", o fio condutor é sempre o mesmo destruição, batalhas, violência e mortes... O público, em vez de encontrar diversidade e renovação, é conduzido repetidamente ao mesmo imaginário bélico.
Se isso já empobrece a curadoria artística, o que acontece na plateia é ainda mais grave. A Sustenidos, responsável pela gestão, vem vendendo ingressos de última hora a preços simbólicos, permitindo a entrada desordenada de quem invade poltronas já destinadas a assinantes e compradores antigos. Resultado: barracos em plena sala lírica, discussões entre público fiel e ingressantes tardios, e um clima de balbúrdia incompatível com a dignidade de um teatro centenário.
O Municipal não pode ser palco de guerras nem no repertório, nem na plateia. O público merece respeito, organização e diversidade. O que se vê hoje é um escárnio.
Socorro deve ser dito.
A imagem evidencia um problema estrutural grave na gestão do Theatro Municipal de São Paulo: a ocupação de apenas um terço dos assentos, mesmo a poucos minutos do início da apresentação, revela uma falha estratégica monumental. Não se trata apenas de uma questão estética ou de marketing; trata-se de gestão financeira e de respeito à fidelidade do público.
Enquanto a maior parte da plateia ocupa lugares adquiridos de última hora, pagantes de ingressos de valor integral são claramente desconsiderados. Essa política implícita de desvalorização do público que sustenta a instituição compromete a receita do teatro, mina a confiança e prejudica o prestígio da instituição. É um desrespeito às práticas mínimas de administração de casas de ópera e teatros centenários, transformando o que deveria ser uma experiência cultural elevada em um espetáculo de descaso.
O retrato é inequívoco: o Municipal não está apenas “meio vazio”, está sob a sombra de uma gestão que privilegia o improviso e o populismo de ingressos simbólicos em detrimento da sustentabilidade e do respeito ao público real. Uma crítica severa e ferrenha é absolutamente necessária para que essa realidade seja enfrentada antes que se consolide como um padrão crônico.
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Comentários
Portanto, a crítica acima tem fundamento. O público fiel já se afasta da temporada como forma de protesto silencioso. Precisamos de críticas como essa para aprimorar e mudar o eixo das programações.